Imagine que você foi convidado a se tornar Scrum Master (SM) de uma equipe. Você sabe qual será o seu papel dentro da organização? Remover impedimentos e organizar as cerimônias do Scrum? Como aluno de MBA fui desafiado a desenvolver um artigo científico e me dediquei a pesquisar sobre o papel do SM nas organizações, visto que tinha há pouco tempo, assumido tal posto na equipe e estava desconfortável com as ideias que vinham sendo empregadas no time até então.

Iniciei a pesquisa entendendo o que é liderança, como ela se relaciona com a cultura organizacional e com os princípios das metodologias ágeis e como o SM influencia o comportamento das pessoas e a criação de um ambiente propício ao desenvolvimento dos valores do Manifesto Ágil, aliado ao entendimento dos pilares do Scrum. Conforme relacionava cada vez mais esses pontos, surgiu a oportunidade de, como time de SMs da empresa em que atuava, realizar um benchmarking para conhecer mais sobre o processo em uma outra empresa de softwares. Além de outras questões, essa visita foi muito importante para estabelecer um elo de confiança e respeito entre os SMs dos vários times internos e resultou, já na semana seguinte, no estabelecimento de uma agenda fixa de encontros semanais com foco no estudo e compartilhamento de boas práticas e conhecimento entre os integrantes.

Após a conclusão do artigo, compartilhei nestes encontros alguns dos pontos que mais me surpreenderam durante essa construção, os quais apresento abaixo, além de demonstrar como venho aplicando esse conhecimento no dia a dia do time.

1. SM é um Líder servidor

Segundo o entendimento de Maximiano, a liderança só acontece quando há influência do líder sobre seus liderados, e quando estes respondem a essa influência de forma positiva. Por isso, existem líderes formais e informais e, muitas vezes, as pessoas em posição de liderança são considerados chefes, exercendo influência por meio de comando e controle. O principal motivador para a liderança é uma tarefa ou missão clara, ou seja, o líder só consegue exercer liderança se os liderados entendem o propósito e o objetivo das ações que são realizadas.

Como SMs, precisamos relembrar o time constantemente desses objetivos, de qual é a missão que estamos cumprindo, de quem queremos atender e quais vidas queremos impactar, pois desta forma, podemos garantir que cada integrante do time conheça, e dê o seu melhor na garantia da concretização dessa visão.

Para manter esse sentimento vivo no time, iniciamos uma agenda semanal de encontros em que todos os integrantes do time tem voz ativa para compartilhar ideias e demonstrar resultados. Por meio de uma apresentação construída de forma colaborativa, todos têm a oportunidade de compartilhar conhecimentos e entender os objetivos de longo e médio prazo do time. Ter uma visão clara não é o bastante em organizações complexas, onde vivemos em constante mudança e a pressão por novos objetivos é diária. Desta forma, criar um ambiente propício ao crescimento e à inovação também se tornam responsabilidade do SM como agente de mudança.

2. O SM é um agente de mudança

O Manifesto Ágil trouxe novos valores e princípios para as organizações que veem nestes, uma oportunidade de sobreviver em um ambiente cada vez mais complexo. Porém, tais valores contradizem culturas a muito estabelecidas e, mesmo em áreas mais abertas ao pensamento ágil, cria um ambiente que realmente traduz os princípios é bastante desafiador.

Chiavenato utiliza, em suas publicações, uma ilustração que compara a cultura organizacional à um iceberg, em que os acordos escritos e documentados são representados pela parte visível e tem fácil identificação. Já os aspectos psicológicos e sociológicos encontram-se na parte submersa, muito maior e de difícil identificação e caracterização. Esses aspectos representam e ditam aspectos como percepções, sentimentos, atitudes, valores e normas do grupo e que, por não estarem documentados e visíveis, se tornam difíceis de identificar e mudar.

Baseado no empirismo, o Scrum traz nos seus pilares os conceitos de transparência, inspeção e adaptação que, quando aplicados no dia a dia de um time, criam um ambiente favorável aos valores de compromisso, coragem, foco, abertura e respeito. Desta forma, o SM como líder que influencia e molda comportamentos e ações têm como responsabilidade desenvolver, administrar e até mesmo suprimir determinados aspectos da cultura do time, buscando o desenvolvimento dos valores descritos no Scrum Guide como forma de trazer para o dia a dia os pilares do empirismo.

No nosso time buscamos desenvolver canais de comunicação e utilizar ferramentas que possibilitem a cocriação e o compartilhamento de ideias. Decisões deixaram de ser tomadas para serem discutidas em grupo, o feedback passou a ser em tempo real e os objetivos se tornaram mais claros para todos. Desta forma, temos conseguido realizar entregas mais frequentes e com maior qualidade, mas com a consciência de que ainda temos um longo caminho a ser percorrido, principalmente no desenvolvimento de pessoas.

3. O SM também é Coach

Sutherland, considerado por muitos como o pai do Scrum, diz que o SM é um líder-servo, algo entre um capitão de time e um técnico. Entendo esta citação como um chamado à ação de não só guiar cerimônias e retirar impedimentos, mas também de ajudar os integrantes do time no seu desenvolvimento pessoal e profissional.

Como já disse anteriormente, um dos pilares do Scrum é a inspeção e, como SM, entendo que essa inspeção deve ser realizada não só no processo, mas também nas pessoas. O Coach é um processo em que objetivos são definidos e o trabalho em conjunto leva a definição de um caminho a ser percorrido para que o objetivo seja alcançado.

Desta forma, é papel do SM ajudar os membros do time a se concentrarem nas entregas, mas também focarem suas ações no desenvolvimento de habilidades e competências as quais estejam alinhadas com seus desejos e pretensões futuras, criando engajamento e comprometimento.

Resumindo, entendo que o papel do SM vai muito além de remover impedimentos, organizar cerimônias ou atualizar o burndown da Sprint. Para que o time realmente viva os valores do Manifesto Ágil, o SM deve assumir uma posição de liderança, criar um ambiente seguro para o desenvolvimento e liderar pelo exemplo, mostrando que também erramos, mas que buscamos sempre o aprendizado. Só que isso já é assunto para outro texto.